quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Era uma vez um país chamado Portugal

Para quem viveu sempre numa aldeia de província ou em cidades pequenas como eu vivi, o facto de agora estar perto de Lisboa e circular por Lisboa muita vez para além de assustador é fascinante.
Para quem conhecia Lisboa pelas noticias dos telejornais ou por uma qualquer visita esporádica a fim de tratar de "papéis" viver hoje às portas de Lisboa torna-se quase que como viver num outro mundo.
É assim que me tenho sentido: viver noutro mundo. Umas vezes bastante atractivo e com mil encantos, outras vezes deveras chocante.
Aliás o que me leva a escrever este Post é isso mesmo, a faceta mais chocante duma capital que eu ouvia falar como moderna, bonita, e de tantas outras definições que me aguçavam a curiosidade.
As grandes avenidas sempre cheias de movimento, os monumentos e sua história, as pessoas sempre apressadas, as estradas sempre lotadas, os teatros, os cinemas, o cruzar-mo-nos nas ruas com pessoas que conhecemos da televisão ou por que se dedicam à política, ou porque os vimos numa das telenovelas. Mas também dos grandes centros comerciais e todo o seu movimento.
E tudo isso já vi e estou a viver. Já visitei grandes espaços comerciais e um dos que ainda não tinha visitado era dos que mais me aguçava a curiosidade: El Corte Ingles.
Finalmente fui ao Corte Inglês. E se pudesse tinha fugido dali num daqueles foguetes que vimos nos filmes de ficção científica. E sabem porquê? Bem vou explicar...
Todos os dias somos bombardeados com o PEC, com a crise, com as dificuldades económicas, com as pessoas a queixarem-se que não têm dinheiro para comer, por campanhas constantes do Banco Alimentar e de outras organizações similares, com as pessoas da minha terra, pequena aldeia, e outras aldeias por este Portugal fora a terem que se levantar de madrugada para irem amanhar as suas leiras de terra, para terem as batatas, o feijão e o milho com que se sustentam e sustentam os seus animais, que trabalham desde antes do nascer do sol até muito depois que o sol se pôs, faça sol, faça chuva ou não faça nada, e verem um centro comercial da capital (e de algumas cidades por este Portugal) é de ficar na dúvida se os noticiários não estão enganados ou nos estão a enganar.
E quando se entra num espaço como o Corte Inglês da nossa capital então chegamos mesmo à conclusão que não vivemos de certeza no mesmo país. Ou então definitivamente enlouquecemos.
No Corte Inglês as grandes marcas internacionais estão lá, Desde os perfumes às roupas, passando pelo calçado e pela electrónica. E tudo do mais sofisticado e caro que se possa imaginar. O que não se pode imaginar é que neste tal Portugal que nos enfiam pelos olhos e ouvidos dentro todos os dias se possa ver esses mesmos espaços totalmente cheios de pessoas a comprar objectos (por vezes pequenos objectos) que dariam para sustentar uma família durante um ano ou mais (aliás o que acontece, infelizmente, é que muitos vivem com bem menos que o valor dum desses objectos). Desde o perfume que custa centenas de euros até à carteira que não fazem por menos de milhares, passando pelo vestido de noite para o reveillon que se aproxima ou pelo casaco que custa mais que alguns automóveis, o que me vem à cabeça é que isto é um mundo de loucos.
E quando uma pessoa como eu que muitas das vezes tira o porta moedas do bolso para contar os cêntimos que tem para ver se lhe chegam para tomar um descafeinado se vê confrontado com este "espectáculo" de compras, fico muitas vezes "bloqueado" não só nos movimentos como nos pensamentos... de boca bem aberta, apesar de me faltarem alguns dentes e a placa já abanar por estar velhinha e não a poder substituir por falta de dinheiro.
E quando saio e como consolo vou dar um passeio para me aliviar do inacreditável que acabei de viver, por uma avenida da Liberdade, à noite, e me deparo com as montras das lojas com carteiras de senhora a 8 mil e tal euros e  mesmo por baixo, da parte de fora, vejo um sem abrigo a dormir em cima de caixas de papelão, dá-me cá uma revolta, um desejo enorme de fugir, uma vontade de ir a um desses briefing que os nossos governantes por vezes nos dão ou pelas entrevistas que dão nas TV's e chamar-lhes mentirosos, aldrabões, falsos, e sei lá que nomes mais. E começo a compreender porque muitas das vezes esses mesmos governantes passam pelas avenidas de Lisboa em carros (topo da gama) em altas velocidades e com uma catrefada de polícias em potentes motos a abrir caminho: é que eles nem querem ver a merda em que nos puseram.
Mas depois paro e penso: afinal a culpa nem é deles, é de muitas dessas pessoas que enchem esses espaços comerciais  todos, que lá vão "comprar" esses objectos de marca e que lhes dá um "status" de grã-finos, mas fazem filas enormes no "Departamento de Crédito" desses mesmos espaços comerciais. Afinal somos o País que todos fazemos e se as empresas de crédito e os bancos têm milhões de euros em crédito mal-parado, ainda deveriam ter mais, pois são elas mesmos que nos proporcionam viver uma vida de mentira. Elas deveriam era falirem todas, mas infelizmente isso não vai acontecer, porque os governos dão pensões de reforma de meia centena de contos a muitos velhos que passaram a vida toda a trabalhar, enquanto dão milhões a empresas que sustentam corruptos e oportunistas.
Sinceramente penso que vivemos num País de fantasia e por isso porque ainda espero um dia contar histórias de embalar a um neto meu, quando lhes falar de Portugal, deste Portugal em que hoje vivemos, começarei assim: "Era uma vez um País chamado Portugal..."
Bom Natal para todos e que 2011 não seja aquilo que o senhor Primeiro-Ministro, o Senhor Ministro das Finanças, o Senhor Cardeal Patriarca e muitos outros senhores das altas esferas nos estão já a avisar que vai ser, porque se assim for, continuaremos a viver num país de mentira, de falsos, do salve-se quem puder...
Passem bem!

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